A chacina com oito mortos — o maior número em um assassinato múltiplo ocorrido no Estado neste século — no final da noite da última segunda-feira (18), aqui em Viamão, é mais uma comprovação da nova tática utilizada pelos grupos criminosos que disputam territórios do tráfico na Região Metropolitana: invadem áreas dominadas pelos rivais e matam indiscriminadamente quem enxergam em torno de um local alvo.
Desta vez, em um intervalo de tempo de meia hora, em três endereços distantes 700 metros entre si, no bairro Vila Augusta, foram mortos quatro mulheres e quatro homens. Em um dos locais, quatro crianças e um cadeirante foram poupados. O oitavo corpo, de um homem, foi encontrado no final da manhã de terça-feira no Arroio Feijó, também na Vila Augusta, nas proximidades dos locais dos outros crimes.
Foi a 14ª chacina do ano na Região Metropolitana, com um total de 49 vítimas. Desde que a editoria de Segurança de GaúchaZH e do Diário Gaúcho iniciou o levantamento de homicídios, em 2011, o número também é recorde. Até então, no período entre 1º de janeiro e 18 de junho, a maior incidência havia sido no ano passado, com nove casos e 31 mortes. O uso dessa tática está crescendo.
Em Viamão, foi a terceira chacina de 2018, em um intervalo de 74 dias. Com as sete de segunda-feira, já são 13 vítimas deste tipo de crime, no ano. Antes mesmo da situação atual, o 11º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado no ano passado, já apontava o Rio Grande do Sul com o segundo Estado do país com maior registro de chacinas, atrás apenas do Rio de Janeiro.
O diretor de investigações do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), delegado Gabriel Bicca, avalia a situação como uma evolução do crime e um retrocesso em termos de sociedade.
"Antes, o autor matava um desafeto, em uma personificação da inimizade. Depois, passou a ser uma questão de disputa entre grupos, com a morte dos integrantes do grupo rival. Agora, parece ser regional: quem estiver naquela área dominada pelo grupo rival está correndo riscos, independentemente de estar envolvido ou não", avalia.
Bicca cita como exemplo a chacina ocorrida no dia 4 de junho no bairro Rubem Berta, em Porto Alegre, em que três pessoas foram mortas e outras duas ficaram feridas quando um grupo de encapuzados invadiu a tiros um beco que concentrava usuários de drogas, possivelmente confundindo o local com um ponto de tráfico.
"Vídeos e áudios compartilhados e conversas informais mostram que as invasões ocorreram sem muitos critérios, como por exemplo, "lá é uma área dos contras". Se a boca de fumo funciona em uma casa, quem estiver lá e nas proximidades estará sujeito a ser morto, pois não há alvos específicos. É tudo meio aleatório", explica.
Com essa nova tática, aumentam os riscos para pessoas sem antecedentes e sem envolvimento com o tráfico de drogas. De acordo com o delegado, em algumas comunidades, jovens, principalmente, já estão sendo orientados e fugir de alguns estereótipos.
"Bonés, camisetas de times de futebol, bermudas largas em áreas dominadas por rivais estão ficando perigosos. É complicada essa maneira de atuar. Beira a covardia. Matam sem que haja enfrentamento.
Para o sociólogo Rodrigo Ghiringhelli de Azevedo, a situação resulta da falta de uma efetiva política de segurança pública.
"Estamos vivendo cada vez mais a produção da cultura da violência, como consequência da política criminal das drogas e de um encarceramento em massa que, como efeito colateral, produz grupos cada vez mais violentos. Para manter e ampliar seus limites, esses grupos acabam eliminando sem limites. E não há um mecanismo de contenção para lidar", afirma.
Para o sociólogo, o processo resulta de omissões que, em sua análise, já duram mais de quatro décadas.
"São consequências das políticas de segurança desde o período militar. Não se pensa em gestão da segurança pública. Caminhamos para o fortalecimento desses fenômenos, que são resultado da política dos últimos 40 anos no Brasil".
*com informações da Agência RBS...
.